O filosofar pode ser visto como uma necessidade humana básica na
medida em que precisamos lidar de maneira reflexiva com os desafios e
conflitos impostos pela vida, buscando elaborar os significados ou
motivos mais profundos da existência.
A educação filosófica busca compreender o papel fundamental da Filosofia numa educação que tenha o propósito de formação integral do ser humano, um ser com possibilidades de modificação e crescimento. Ela busca potencializar as capacidades do pensamento autônomo e autocorretivo pelo exercício da reflexão, investigação, crítica, criatividade e compromisso com a ética, a cidadania e a democracia.
O caminho que propomos para a educação filosófica é a comunidade de prática do filosofar. Alguns aspectos da educação filosófica:
A educação filosófica busca compreender o papel fundamental da Filosofia numa educação que tenha o propósito de formação integral do ser humano, um ser com possibilidades de modificação e crescimento. Ela busca potencializar as capacidades do pensamento autônomo e autocorretivo pelo exercício da reflexão, investigação, crítica, criatividade e compromisso com a ética, a cidadania e a democracia.
O caminho que propomos para a educação filosófica é a comunidade de prática do filosofar. Alguns aspectos da educação filosófica:
1. A Pergunta. A força interrogante do pensamento é a
base do filosofar. A prática do filosofar é orientada pelo
questionamento aberto, contínuo, constante de modo a constituir um
processo de investigação acumulativo, coerente, consistente e
conseqüente. A pergunta é a alma ou essência desta atividade que permite
ao pensamento a elaboração reflexiva dos sentidos da experiência. A
pergunta que nasce da própria experiência de perplexidade ou espanto
diante do mundo é a mais original fonte do interesse. Perguntar é uma
escolha de rever as crenças, suspeitar das certezas estabelecidas. É
permitir-se olhar para os aspectos problemáticos da vida. Transformar a
insatisfação diante dos desafios da existência em um projeto de
inquirição. Daí surge a necessidade buscar novas explicações, definir e
clarificar os conceitos, resolver problemas. Quem faz um questionamento
realmente intrigante, percebe um problema vital empenha todos os seus
esforços na busca dos sentidos verdadeiros. O espírito problematizador
que incorpora o hábito de perguntar vê os sentidos encontrados pela
investigação como provisórios e sujeitos a novas indagações, criando um
processo que se desenvolve de forma aberta e acumulativa através do
perguntar-responder-perguntar.
2. Os Conceitos e os problemas. A indagação
filosófica se ocupa das questões conceituais ou dos problemas que dizem
respeito à vida das pessoas. Investigar conceitos ou problemas é uma
necessidade humana para dar significação a experiência que se realiza na
interação do individual-social, subjetivo-cultural. A prática do
filosofar se desenvolve na reflexão sobre a linguagem que usamos para
dar significados ao mundo, inclusive sobre o próprio filosofar. Pensamos
com conceitos, mas, sobretudo, pensamos quando questionamos os
conceitos e nos colocamos na investigação profunda, radical, abrangente e
autocorretiva dos sentidos, dentro das exigências colocadas pela vida
na sua multiplicidade de relações. Assim sendo, os conceitos passam a
ser vistos como entidades históricas, complexas, controversas e,
portanto, sujeitos ao fórum público da coletividade a que pertencemos
num espírito de razoabilidade.
3. O Pensamento. A reflexão filosófica se dirige
para a (des)construção dos conhecimentos, idéias ou conceitos e procura
examinar o próprio processo falível do pensar avaliando a pertinência
dos raciocínios, interpretações e julgamentos feitos. A filosofia se
preocupa com uma cultura do pensar, promovendo a crítica do pensar –
procedimentos, inferências, métodos, resultados – descobrindo os erros e
se autocorrigindo. Neste processo, aprimora as habilidades de pensar
que passam a ser instrumentos auxiliares no processo de investigação.
Constrói-se assim uma relação dialética no processo investigativo entre o
processo e o produto, meios e fins do pensar. O filosofar pode
contribuir para a potencialização das capacidades de pensar, tornando o
pensar consciente de si mesmo, ou seja, aprende-se a pensar por si
mesmo. Aprende-se a transformar e usar o aprendido para a vida, não para
a mera erudição. Este aprender a pensar, além de articular
conhecimentos oriundos de diversas áreas, faz do aprendido bases para
lançar-se além dele, para explorar o horizonte desconhecido e intrigante
da condição humana. Isto só é possível quando se forma as capacidades
de articulação, flexibilidade e autonomia do pensar e agir. Se filosofar
é cuidar do aprimoramento do pensar e o pensar é um direito da pessoa,
então parece necessário garantir o acesso ao filosofar.
4. O Diálogo. A prática do filosofar se desenvolve
no diálogo entre pessoas dispostas a se engajar na investigação de
problemas comuns. Pressupõe interesse e envolvimento profundo no
processo deliberativo de busca da verdade. O diálogo é gerado e se
movimenta no conflito de pontos de vista. È preciso reconher que cada
poto de vista é também um ponto de cegueira. Por isso, dialogar
pressupõe “enxergar” com os olhos dos outros aquilo que não se conseguiu
ver com os próprios olhos. Ter pontos de vista diferente não significa
que os dialogantes são desiguais. Não é possível diálogo numa relação
autoritária em que um lado se acha dono da verdade. Por isso, o diálogo
exige procedimentos recíprocos para potencializar as diferenças mas
regular a igualdade de condições de participação. Tais procedimentos que
podemos chamar de habilidades sociais – ouvir atentamente, falar na sua
vez, respeitar opiniões, ser tolerante, etc. – devem ser criados no
exercício do próprio diálogo. Filosofar pode ser visto como o dialogar
no exercício da racionalidade guiada por considerações lógicas e
metacognitivas e pelos valores que proporcionam a interação social como
cooperação, respeito, empatia, humildade, autocorreção, aspectos
importantes para o crescimento da autonomia de pensar.
5. Os Filósofos. Pela prática do filosofar foram
criados conceitos e elaboradas soluções para certos problemas
reconhecidos de grande importância para compreender a experiência
humana. O acúmulo de reflexão dos filósofos nas mais diferentes culturas
tem sempre algo a nos dizer quando nos defrontamos com tais conceitos
ou problemas. Tem poder de iluminar a caminhada, mas não fazer a
caminhada de quem está a caminho. Dialogar com a experiência dos
filósofos, lendo e relendo seus textos, é uma parte importante do
processo de filosofar para repensar os conceitos no processo de sua
apropriação e usar o aprendido para a vida. Este trabalho potencializa o
pensamento e amplia as possibilidades de interpretar as novas
exigências sociais. Por outro lado, as condições sob as quais acontece a
experiência presente, pelas mudanças históricas e novos desafios
colocados para o ser humano, exigem também pensar novos conceitos e
soluções buscando adequar às novas condições da existência. A prática do
filosofar se dá numa aproximação crítica da cultura e numa postura
criativa apontando possíveis caminhos para direcionar a experiência.
6. O Filosofar. A prática do filosofar só é possível
no exercício das liberdades humanas: liberdade de pensar, expressar,
escolher e agir. Ninguém é livre à custódia. Há muitas restrições à
liberdade como quando o aprendizado é dominado pela memorização, pela
primazia da transmissão do conteúdo ou de um saber enciclopédico; ou
onde a vida se tornou uma rotina pela repetição mecânica de habilidades,
ou ainda onde impera a ideologia de um pensamento hegemônico que impõe
seus padrões de pensar como no caso do neoliberalismo, ou ainda quando
há carência das necessidades básicas de vida. Querer filosofar de
maneira abstrata e ilhada parece ser uma ilusão. Melhor seria falar em
libertação vendo no filosofar a sua força motriz. Não se trata de um
trabalho que só se pode fazer em certa idade, mas de uma atividade
perene na vida. A qualidade do filosofar depende das mediações. O
filosofar se dá a partir de um lugar, ou seja, da experiência em um
contexto histórico, social e cultural que tem que ser levado em conta
sem se deixar conformar pelas condições dadas. Filosofar, ao por em
dúvida certas crenças, busca fugir da limitação do grupo social e
proporcionar contato com ambiente mais amplo. Aceita o desafio de abrir
horizonte, transcender as limitações impostas pelas circunstâncias
imaginando e inventando novos significados, novos lugares, novas
alternativas. A liberdade de pensar implica em compreender e transformar
o conhecimento gerando a possibilidades de ser diferente. A
possibilidade de modificação de si e da sociedade exige também
responsabilidade pela construção da nova realidade e pelas consequência
das ações. Filosofar como prática da liberdade pressupõe o compromisso
com o destino da realidade pensada e assumida.
7. A Cidadania. Filosofar é a condição primeira para
o exercício do direito de ter direitos. Ser cidadão no mundo atual
exige o desenvolvimento da capacidade de pensar e agir de forma crítica,
criteriosa, criativa e responsável. Há que se pensar o sentido da
justiça, do bem comum, dos direitos e dos deveres. O exercício
consciente da cidadania não é compatível com a alienação dos problemas
da vida social e profissional. Daí que o exercício da cidadania passa
necessariamente pela investigação rigorosa, participativa e pública dos
significados e referências da comunidade, constituindo-se uma dimensão
política e pedagógica da prática do filosofar. Cidadania é muito mais do
que a reivindicação de direitos e cumprimento de deveres é um paradigma
de conhecimento e de vida democrática alicerçado no diálogo, na
reflexão e na investigação cooperativa. O que está em jogo é o
desenvolvimento da consciência do indivíduo como personagem social capaz
de intervenções em seu meio. A cidadania só se realiza na participação
democrática que torna possível o acesso aos bens sociais, culturais e
naturais. A democracia pode ser vista aqui como a condição de
possibilidade da vida compartilhada que proporciona vastas oportunidades
de tornar possível a solução de problemas pela inteligência
cooperativa. Cidadania e democracia são também conceitos que necessitam
ser continuamente reinventados pela reflexão filosófica.
8. A Ética. A prática do filosofar é em si uma
experiência ética que investiga o sentido dos valores morais, das
regras, dos costumes, dos hábitos que orientam a vida das pessoas.
Indaga-se pelos conceitos e razões que as pessoas usam para dizer que as
coisas são certas, justas, boas, etc. A prática moralizante que incute
valores, normas e leis pela força da autoridade para serem seguidos como
verdades absolutas forma pessoas heterônomas, dependentes e com medo da
punição. A investigação ética, refletindo sobre os valores da cultura,
busca ressignificar ou mesmo criar novos valores dentro das exigências
sociais. A investigação ética exercita o pensamento e a imaginação na
busca das melhores oportunidades para construir um mundo mais habitável,
humano e solidário onde seja possível realizar o bem maior que é a
felicidade. A ética pressupõe a construção da identidade, do caráter, ou
seja, o desenvolvimento integral da pessoa. Este processo dá-se numa
relação intersubjetiva. É no diálogo com os outros que se dá a
descoberta das próprias capacidades. Aprende-se a lidar com as
qualidades e potencialidades, desenvolve-se um estilo de pensar e agir,
apura-se a dimensão do gosto e da vontade, sobretudo, cria condições de
possibilidade de decidir o destino pessoal. Assim, adquire-se
consciência da singularidade de si mesmo, aprendendo a se valorizar, a
ter respeito próprio e responsabilidade pela condução de sua vida.
Aprende-se também a tratar com respeito os outros. Estes são alguns
aprendizados que criam condições para o pensar e o agir éticos de forma
autônoma. A autonomia implica ter auto-estima e se autogovernar levando
em conta o outro. Autonomia pode ser entendida como o exercício do
autogoverno na relação com os membros de uma comunidade. Implica
respeito ao outro como diferente e co-constituidor de si mesmo. Uma
diferença no grupo deve fazer diferença para cada um. Por isso, o
filosofar ético pode estimular as diferenças enriquecedoras e prevenir
discriminações que produzem desigualdade, intolerância, violência e o
empobrecimento das relações sociais. Pelo filosofar ético desenvolve-se a
consciência moral que é a mais completa e ampla de todas.
9. A Educação. A prática do filosofar é uma forma de
educação do pensamento. O pressuposto da educação é a crença na
possibilidade do pensameto poder ser modificado, desenvolvido,
aperfeiçoado. O filosofar cultiva a excelência do pensar. O eixo em
torno do qual gravita a educação é o pensar e não o aprender conteúdos
ou habilidades. A filosofia lida com a experiência de pensamento que se
desenvolve e cresce trabalhando na (des)construção das múltiplas formas
do ser, buscando encontrar a unidade na diversidade. O filosofar pode
ser vista como um processo contínuo e permanente de fazer-se a si mesmo
empoderando-se dos sentidos do humano, através do questionamento e da
reflexão criadores das referências que orientam a vida. Filosofar é uma
prática de formação das formas de ser, de fazer-se humano, pela
atividade da imaginação, criatividade e investigação. Trata-se de um
trabalho sobre a própria potencialidade do ser para formar-se na
abertura de seu espírito em direção à vida social onde se dá a sua mais
plena realização. A filosofia é uma ferramenta fundamental para o
processo de emancipação que é necessariamente questionador e criador de
novas realidades. Por isso, a filosofia é vida e ao mesmo tempo educação
e, neste sentido, nos faz sujeitos da própria história.
10. A Interdisciplinaridade. Na prática do
filosofar o pensamento volta-se sobre sua prática. Interroga sobre seus
caminhos, seus critérios, seus procedimentos, seus resultados e os meios
para saber o que é verdadeiro e como alcançá-lo no processo da
investigação. Busca educar a si mesmo através dos processos de análise,
de crítica e de autocorreção do comportamento investigativo, aprimorando
o próprio processo. A filosofia se preocupa com os aspectos lógicos do
pensamento e aspectos epistemológicos do conhecimento. Além disso, a
filosofia se preocupa com outras áreas de relevante valor para a
experiência como a ética, a estética, a política, antropologia, dentre
outras. Estas áreas tratam de conceitos que se interpenetram com todas
as demais áreas de conhecimento. A prática do cientista ou do professor
não é neutra. Ela está ancorada em pressupostos lógicos,
epistemológicos, estéticos, políticos, antropológicos. Neste sentido a
filosofia pode ser praticada nas diversas áreas de conhecimento evitando
um pensar reducionista, provinciano, fragmentado. A crise do pensamento
atual, da fragmentação e dispersão dos saberes do currículo escolar e
da própria cultura se deve em parte à falta da reflexão filosófica
profunda, radical, abrangente capaz de articular dialeticamente as
dimensões de parte-todo, meios e fins, teoria e prática, conteúdo e
método, sujeito e objeto. Assim, filosofar pode ser visto como um lugar e
um instrumento da articulação curricular e cultural, como gestadora de
um diálogo entre intra e interdisciplinar capaz de favorecer a
compreensão através de um pensar complexo, holístico, totalizante.
Estas reflexões são apenas um convite para um diálogo mais profundo
sobre o significado do filosofar, aqui entendido como um direito
fundamental do ser humano.
A palavra filosofia foi criada pela união das palavras amor ou amizade e sabedoria. A força do amor ou da amizade deveria mover cada um a se envolver numa luta pela democratização do acesso à filosofia em todas as idades, em todos os momentos da educação que se proponha formadora das pessoas, em todos os espaços da vida. O amor é um sentimento contagiante.
A palavra filosofia foi criada pela união das palavras amor ou amizade e sabedoria. A força do amor ou da amizade deveria mover cada um a se envolver numa luta pela democratização do acesso à filosofia em todas as idades, em todos os momentos da educação que se proponha formadora das pessoas, em todos os espaços da vida. O amor é um sentimento contagiante.
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